Aprender ao longo da vida… |Sofia Duarte

O Retomar da Escola na Educação de Adultos

Apesar de estarmos já há mais de duas décadas no século XXI, e de, há mais de uma década, o ensino obrigatório em Portugal ser até aos 18 anos ou corresponder à conclusão do 12º ano, ainda há, no nosso país, quase 6% de iletrados com 15 e mais anos de idade, sendo que apenas 23,5% do mesmo grupo etário tinha concluído o ensino secundário (fonte: Census 2021).
Já no concelho da Marinha Grande, para o mesmo grupo etário e de acordo com a mesma fonte, 13,4% da população residente não tinha nenhum nível de escolarização, sendo que cerca de 1/3 desta era considerada analfabeta, 30,6% não tinha o 3º ciclo de escolaridade e 27,5% tinha o 12º ano.
Embora a taxa de desemprego não seja muito elevada no concelho (ronda os 6%), a escolarização da população residente com 15 ou mais anos com até ao 2º ciclo é ainda significativa, correspondendo a quase 1/3 dos desempregados inscritos. Quanto a tendências demográficas, continua a haver um crescimento da população oriunda de outros países, nomeadamente a não falante de Português, constituindo já 7,3 % da população residente (e cerca de 15% da população escolar do agrupamento).
Estes dados traduzem-se em desafios que o Centro Qualifica e o Departamento de Educação e Formação de Adultos do nosso agrupamento enfrentam, pois estes poderão ser a resposta adequada para a população menos qualificada, quer empregada quer desempregada, por lhe possibilitarem uma oportunidade efetiva do aumento da escolarização, e também para a população não nacional através da oferta de cursos com vista à aquisição de proficiência linguística, essencial para a sua integração social.
Ao longo do nosso trabalho nesta última década, no entanto, percebemos que nem sempre tínhamos resposta para os adultos menos qualificados e mais vulneráveis no mercado de trabalho. Referimo-nos aos iletrados (das “letras”, mas também das competências digitais), aos jovens com baixa escolarização, aos desempregados com poucas competências para a sua empregabilidade, aos estrangeiros que se apresentam sem reconhecimento legal da sua escolarização e que não falam português, aos reclusos, aos elementos da comunidade cigana.
Foi por termos esta consciência que nos decidimos candidatar aos Projetos Locais Promotores de Qualificações de Nível B1/B2/B3, dinamizados ao abrigo do Plano de Recuperação e Resiliência.
Sendo a qualidade das parceiras fundamental, desde logo nos pareceu claro que teríamos de envolver a autarquia, as juntas de freguesia, as associações e as instituições do Estado com intervenção social. Assinámos protocolos de parceria com a câmara municipal e as três juntas de freguesia do concelho, segurança social, centro de saúde, IPSS, associações sem fins lucrativos, associação de reformados, confederação de pais, CPCJ, tendo recebido ainda parecer favorável da PSP e do Estabelecimento Prisional de Leiria.
Em estreita colaboração com os parceiros, iremos desenvolver processos de formação e certificação híbridos, que associem os conhecimentos das UC do RCC do básico a percursos de curta e média duração, como o Programa “Certificado de Competências Digitais”, os cursos de “Português Língua de Acolhimento” e ainda Competências Transversais do CNQ - Ativação e Técnicas de Procura de Emprego.
Regressando à temática que originou esta reflexão, os “recomeços”, o Centro Qualifica poderá representar para muitos adultos uma porta que se abre para regressos à escola. Para outros, poderá ser a primeira vez que vão à escola (ou que a escola vai até eles). O nosso desejo – do diretor, meu e da equipa com muitos anos de experiência que constitui o Departamento de Educação e Formação de Adultos – é que este (re)começo seja apenas mais um passo na valorização pessoal e social de todos aqueles que já se sentiram marginalizados por um sistema educativo que, mais preocupado do que em formar cidadãos, funcionava como um meio exclusor de todos aqueles que não correspondiam a um ideal normativo onde muito poucos se enquadravam e venciam.

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