Pedro Pinheiro
É o melhor dos melhores, a ausência dos piores terrores com a salvaguarda e proteção dos criadores. Algo para que se descanse e que as chamas da guerra se apaguem. Que se torne num infinito transe em que as tramas da terra vazem. Que seja mutilado o espírito animal, o desejo incontrolável da pessoa que agora voa para o plano astral. Esse homem teve esse presente garantido, foi-lhe dado por um ex-amigo, companheiro militar que lutou com ele na guerra e o salvou do abismo onde poderia vir a ficar. Mas este rejeitou a oferta e com o seu anjo quis ficar na miséria de um mundo obsceno, imundo terreno terráqueo que planeia revolta e revolução, pois quer tirar a utopia do céu e trazê-la para o chão. Continuou a teimar enquanto fumava, pois assim desanuviava a mente e pensava calmamente se valia a pena engolir o orgulho ou sorrir com a cara cravado no entulho. Era sujo o pensar e o sentir era corrompido, isto porque quando se traz um anjo para a terra a pureza desse ser é removida, aos poucos e poucos é mais reconhecida a face desse ser que começa a virar humano, pois experiencia os desprazeres, fica a conhecer os maldizeres e o alto estado da mente é rebaixado a decadente, tornando o ser volátil e carente. Humano e animal que acaba por fazer o mal. Tinha boas intenções, não tinha preocupações com as noções que as pessoas tinham sobre ele. Homem mais que decidido a concretizar a impossível utopia no meio da discordância gerada pela infindável, incomensurável e inimaginável ganância de todas as entidades frágeis, de mentes fechadas e assombradas pelo poder de quem com um dedo decide quem vive e quem faz sofrer. Porém foi em vão, tais intenções não chegam a corações que não querem seguir direções. Não há união, não existe uma resolução para que a perfeita noção seja mantida em cada coração. É a falha humana, o erro fatal do mero mortal que condena a paz e gera a guerra. O anjo caído, agora perdido em desânimo, agarrado ao teatro da vida, a imagem do real que mantém a verdade escondida, a cortina pura e sagrada que divide a terra suja do reino de prata... Nem com este ser o homem foi capaz de trazer para o mundo terreno o pleno desejo sem fundo que contém tudo! E o homem… Esse homem que cai e continua a cair… Não pode mais voar e decerto não voltará a sorrir. Foi-lhe posto um fim, algo irreparável para que a alma não consiga mais dizer que sim. Ficará preso num remoinho de revolta, rodeado pelo caos, sem acesso a uma porta, uma escapatória remota… Foi um sonho que acabou em pesadelo, com um ser medonho que acabou por removê-lo… Morreu finalmente e do seu sonho se esqueceu, foi esse o homem que, por ter tentado trazer o céu à terra, se perdeu… Teve consigo um anjo celestial que, comparado ao seu sonho, era igual.