Alda Angelina Santos| OS PONTOS E VÍRGULAS DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA
A escola do salazarismo era profundamente ideológica na defesa dos valores tradicionais “Deus, Pátria, Família” (entendidos no seu sentido mais retrógrado, com a igreja a supervisionar tudo ao toque do sino da sua torre e as mulheres entregues à lida doméstica, com um rancho de filhos atrás, e os homens ao trabalho do campo para sustentar a casa). A instrução das massas devia ser básica, de 3 anos para as raparigas e 4 para os rapazes (isto já nos anos 50), e visava que todos aprendessem a ler, escrever e contar. Só os privilegiados é que tinham acesso aos outros graus de ensino e a universidade era para um pequena elite que se autorreproduzia. Um(a) professor(a) primário(a) – ou regente escolar – tinha uma turma de cada sexo, uns da parte da manhã, por exemplo, as raparigas, outros da parte da tarde, talvez os rapazes, quando as escolas não tinham ainda mais do que uma ou duas salas. E havia o crucifixo e o retrato de Salazar e do Presidente da República de então, na parede, além da régua ou palmatória para castigar os indisciplinados e os “burros”. Sim, porque o ministro da Educação da época teceu umas considerações num jornal diário, nos anos 30, em que dividia a população escolar nas seguintes percentagens: 8% são “ineducáveis” – isto é, não se pode fazer nada por eles – 15% são “normais estúpidos” – é preciso muito trabalho para conseguir deles alguma coisa de vez em quando – 60% têm inteligência média e só 2% é que são “notáveis”… Portanto, à partida, 23% dos alunos são para pôr fora do sistema o mais depressa possível!
Da reforma de Veiga Simão (iniciada no período marcelista pós-Salazar), ao 25 de Abril de 1974 e, na sua sequência, nas décadas seguintes (passando pela Lei de Bases de 1986 e o alargamento da escolaridade obrigatória para nove anos), em termos de educação e escola pública, pode-se dizer que esta se transformou numa questão central e ocupou um lugar extremamente importante no processo democrático em curso desde então e mudou completamente o panorama sociocultural do país, levando-o a aproximar-se dos valores que se registavam nos países da OCDE. Também a introdução no setor público da Educação Pré-escolar e da Educação Especial, a continuação da unificação do ensino, a mudança de programas e de métodos pedagógicos e, sobretudo, a entrada e manutenção de largas centenas de milhar de novos alunos que passaram a estar mais anos na escola pública, mudaram completamente a tipologia do sistema educativo português que, de elitista passou à massificação, proporcionando a quase todas as crianças em idade escolar a igualdade de oportunidades de acesso ao sistema e contribuindo para a sua democratização.