Discriminação positiva|Mariana Silva

Os termos “discriminação” e “igualdade” são recorrentes no nosso quotidiano. Solucionar o problema da discriminação ajudará no combate à desigualdade existente no planeta Terra. Em abono da verdade, existem diferentes tipos de discriminação, isto é, esta pode ser positiva ou negativa. Talvez, os leitores estejam mais familiarizados com a discriminação negativa, seja nas notícias, seja na escola, somos bombardeados com relatos de seres humanos, que vivem enredados por preconceitos, sendo-lhes negado determinados direitos fundamentais. Mas, em que consiste a discriminação positiva? De acordo com o dicionário, a discriminação positiva é um tipo de discriminação que tem como finalidade selecionar pessoas em situação de desvantagem e favorecê-las. Porém, será capaz um tipo de discriminação trazer a tão célebre igualdade ao nosso mundo? Alguns defendem, acerrimamente, que sim; já eu, acredito que não.
No meu humilde entendimento, a discriminação positiva não deve ser posta em prática, já que origina um resultado perverso. Ainda que o intuito seja deveras nobre e vise, portanto, alcançar uma sociedade justa e igualitária, defendo que não é através desta postura que se irá solucionar uma disfunção existente há séculos, atrevendo-me a dizer, já enraizada no ADN humano. A discriminação positiva assenta num paradoxo, pois equiparar grupos que são discriminados negativamente, para que tenham acesso igualitário à sociedade, favorecendo-os deliberadamente, acaba por contribuir para a violação dos direitos humanos. Ao existir uma abordagem compensatória, um auxílio preferencial para com um determinado grupo em desvantagem, apenas fica acentuado o fosso e a ideia de que esse grupo é especial e necessita de circunstâncias igualmente especiais. Reforça-se o pensamento de que estes grupos não são capazes de atingir os seus objetivos, precisando, assim “de uma mãozinha”. Como se sentirão estas pessoas? É claro que todas as pessoas que passam por dificuldades devem, sim, ser ajudadas, mas não julgo ser deste modo que se atinge a igualdade. No meu ponto de vista, uma sociedade igualitária existirá, apenas, quando estes “fossos” forem vedados, quando estes “certos grupos” não existirem e quando a necessidade de ajudar não for precisa, pois já estará incutido o auxílio a que todos devem ter acesso, independentemente das suas diferenças. Ao dar-se, aos grupos marginalizados por preconceitos descabidos, privilégios, outros acabam por sofrer, sendo lesados, sem nada terem cometido que causasse danos às comunidades desfavorecidas. Na verdade, o grupo desprotegido também nada fez para ser alvo de preconceitos, porém, creio que o respeito pela diferença sob a forma de um tipo de discriminação não é o caminho a seguir na erradicação de desigualdades, pois, querendo ou não, esta gera mais desigualdade noutros grupos e prováveis ressentimentos, levando à incrementação de novos preconceitos. Honestamente, estou em crer que não é na base do ódio e do ressentimento que surgirá uma sociedade mais justa, harmoniosa e igualitária. É necessário estar consciente dos resultados a longo prazo: se a prática da discriminação positiva se tornasse um hábito, esta tentativa nobre de igualdade tornar-se-ia num ciclo vicioso. As pessoas que não necessitam de ser discriminadas positivamente, acabariam prejudicadas em relação às beneficiadas, e, posteriormente, iriam ser elas próprias a necessitar de condições especiais que as favorecessem para atingirem os seus objetivos e sonhos. Como exemplo dos resultados perversos que a discriminação positiva pode assumir, temos o célebre caso Bakke. Alan Bakke candidatou-se à Faculdade de Medicina da Universidade da Califórnia. A Faculdade de Medicina, para aumentar o número de alunos provenientes de minorias desfavorecidas, reservou cerca de 20% dos lugares para tais alunos. Consequentemente, alguns alunos de origem europeia não foram admitidos, tê-lo-iam sido caso essa decisão não tivesse sido tomada. Bakke constava entre esses alunos que não foram admitidos. Considerando-se vítima de uma injustiça, processou a universidade. Ganhou a causa, tendo o juiz sublinhado que “Os programas preferenciais, apesar de terem objetivos nobres, só podem reforçar estereótipos comuns que sustentam que certos grupos são incapazes de obter êxito sem critérios especiais.”. Não podia concordar mais com esta afirmação, pois acredito que para termos uma sociedade justa não deve ser usada a discriminação como argumento, mas, sim, a tentativa de eliminar os preconceitos que assumem que os seres humanos, por isto ou aquilo, são incapazes de atingir os seus próprios sonhos. Acredito que a sociedade deve lutar contra as injustiças, discrepâncias e desigualdades existentes, a fim de melhorar as condições de vida de todos os seres humanos, mas não recorrendo sistematicamente à discriminação positiva. No meu ponto de vista, não é possível erradicar a falta de igualdade na nossa sociedade com uma teoria que dá mais relevância às desigualdades de certos grupos, sublinhando-os mediante um tratamento benevolente a despeito de outros grupos. Está correto que sejam criadas novas oportunidades para os que poderão ser considerados mais desfavorecidos, contudo, nunca devem ser retiradas oportunidades já existentes a outros membros da sociedade. E sobretudo, deve abandonar-se a ideia de que certos grupos da sociedade são superiores a outros. Só então será possível obter uma sociedade equilibrada e justa, com igualdade de direitos para todos os seus membros. E finalmente, no lar onde fiz voluntariado no verão de 2019, uma senhora das minhas relações, com idade para ser minha bisavó e que, na sua juventude, frequentava muitos bailes, contou que nunca aceitava convites para dançar (porque as moças não se queriam oferecidas), a menos que os convidantes fossem negros. Perguntei-lhe, na minha inocência, o porquê e continuo a perguntar o porquê… Porquê aceitar os negros? “Ora, coitadinhos!” foi a resposta... Até hoje não consegui que esta senhora, boa e generosa como poucas, compreendesse a discriminação positiva deste seu tratamento aos dançarinos de raça negra e, assim, o inevitável racismo que o alimenta. Como se vê, neste gesto de caridade está sempre a marca da distância entre o Eu e o Outro.

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