Rubrica: A Propósito de… |Jorge Alves, professor
A Propósito de… O Direito à Educação
Se recuarmos pouco mais de cinquenta anos, no nosso país, aquilo que hoje chamamos o “direito à educação” como sinónimo de se ter direito a ir à escola ainda não era acessível a grande parte da nossa população, mais ainda se se tratasse de alguém com necessidades especiais, para os quais, para muito poucos, a única alternativa eram colégios internos em que essas pessoas ficavam completamente separadas do mundo, como se estivessem dentro de um casulo protetor, onde dificilmente seriam vistos pelos cidadãos comuns e “normais”, que, desta forma, também ficavam protegidos, completamente na ignorância das realidades que se viveriam dentro das paredes desses internatos.
Uma das grandes “conquistas de abril” no domínio da educação foi sem dúvida a tentativa que houve de integrar esses cidadãos na sociedade e, primeiramente, nas escolas onde todos os outros jovens andavam. Contudo, sem haver uma adequada formação de técnicos e professores, esta intenção terá tido, por vezes, resultados muito longe dos que se esperariam, não havendo a devida integração destes alunos “especiais” nas turmas e nas escolas, nem se lhes dando as necessárias “ferramentas” para poderem evoluir e adquirir os conhecimentos como se proporcionavam aos demais.
Lembro-me, para dar um pequeno exemplo pessoal, quando uma professora de matemática do liceu que eu frequentei se deparou em 1974/75 com dois alunos cegos ficar completamente em pânico, sem saber como lhes dar a matéria, até os dispensando dos testes, porque, positivamente, não sabia o que lhes fazer, ou de um outro professor, este de geografia, que pedia a um dos alunos cegos que tinha, que fazia os testes em Braille, para que lhe lesse as suas respostas, o que ele amavelmente fazia, embora emendando as respostas incorretas, porquanto, já soubera as soluções corretas através dos seus colegas.
Mais tarde, já na Faculdade de Letras de Lisboa, um professor catedrático, daqueles que só dava aulas para trezentos alunos no auditório, um ilustre escritor neorrealista, bem-conceituado em um dos partidos da esquerda, terá dito a um aluno cego que se lhe apresentou na aula: “afinal, o que é que o senhor está aqui a fazer”?
Assim, entre caminhos pedregosos e muitos solavancos, se vai proporcionando o direito à educação aos nossos alunos mais especiais. É óbvio e notório que se tem evoluído bastante. Haverá uma maior sensibilidade para enfrentar os problemas específicos que se deparam a estes alunos, a formação dos professores e dos técnicos terá vindo a melhorar, mas continua a faltar qualquer coisa que os faça sentir mais integrados e aceites: talvez um sistema escolar mais humanizado e menos burocratizado, talvez professores, técnicos especializados e psicólogos em maior número e mais disponíveis para fazer um acompanhamento mais personalizado, talvez haver mais alternativas de formação, umas mais escolarizadas outras de teor mais prático e, acima de tudo, a constante busca para melhorarmos o ensino em todas as suas vertentes e cada vez mais abrangente, para que seja verdadeiramente integrador.