Rubrica: A Escola de Outros Tempos… |Jorge Alves, professor

A Escola de Outros Tempos… O Duzentos!

Iniciamos aqui uma nova rubrica na qual tencionamos relembrar situações vividas na nossa escola noutros tempos, para que se reflita de que forma evoluímos. Neste sentido, queremos publicar histórias curiosas, relatos de acontecimentos relevantes, datas importantes para a nossa cidade, para o que gostaríamos de poder ter, para enriquecer os nossos conhecimentos, as participações dos elementos (professores, funcionários) que ainda estejam em atividade, mas que já tenham vivido grandes transformações no nosso espaço escolar, como daqueles (ex-professores, ex-alunos ou ex-funcionários) que queiram recordar algo das suas vivências no nosso agrupamento.
Para iniciar esta série de testemunhos, permitam-me que partilhe convosco uma história, passada em meados dos anos 80 do século passado, em que se demonstra como se exercia o ensino nos cursos noturnos, quando a população escolar que os frequentava era em número bem superior do que a que frequentava o ensino dito “regular”, durante o dia.
Segue a história:

O “Duzentos”
Naquela época, em meados dos anos 80 do século XX, em que todos nós éramos mais novos, bonitos, simpáticos, alegres e cheios de garra (só deixámos de ser tão novos), havia diversos cursos noturnos, tanto para o Ensino Básico como para o Secundário, uns mais dirigidos às áreas comerciais, frequentados predominantemente por raparigas, outros de áreas mais industriais, relacionados com a mecânica, com a eletricidade, com os moldes, entre outros, predominantemente masculinos.
É óbvio que, nessas turmas de jovens alunos, com muitas disciplinas lecionadas por jovens professores, haveria, em alguns casos, certas atrações físicas e sentimentais não seria fora do comum; aliás, houve casais que se formaram a partir de alguns desses encontros escolares. Contudo, o mais normal (confesso que também o senti nos meus tempos de adolescência mais verde) era alguns alunos manifestarem alguma paixão (de forma mais platónica), com alguma jovem professora mais esbelta, ou alguma aluna o manifestar em relação a algum professor mais atraente.
Sucedeu que, numa turma de um curso de mecânica, ou de eletricidade (já não me recorda bem a área), cuja professora de Físico-Química era uma jovem, formosa e simpática leiriense, a generalidade dos alunos era bem “fraquinha”, manifestando poucas capacidades e interesses perante as matérias que eram lecionadas, contudo, sendo todos bastante corretos, bem-comportados e atenciosos, o que não seria a regra nessas turmas. Entre os seus elementos, salientava-se um deles, não pela sua grande inteligência ou pela sua ativa participação, mas bem pelo contrário: mais que os outros, que raramente participava, mantinha-se em absoluto silêncio, nem respondendo aos professores, quando para isso era solicitado, sendo, portanto, alvo dos comentários entre os colegas que lecionavam essa turma, na sala de professores. Para além do mais, como ele tinha o número redondo de 200, foi por esse epíteto que começou a ser conhecido na escola, quando, ao fim da noite, os professores comentavam os sucessos e as peripécias tidas nas suas aulas.
Porém, no último dia de aulas desse ano letivo, algo de extraordinário sucedeu que todos admirou, sobretudo à formosa e jovem professora de Físico-Química. Em certa ocasião, enquanto a generalidade dos professores que já tinham terminado as aulas conversavam amenamente na sala de professores, ouviu-se, partindo de uma sala de um piso inferior, uma enorme salva de palmas, tendo-se começado a comentar: (Olha, na aula da (…) está a haver uma grande festa! O que se passará por lá”?
Entretanto, alguém comentava: “Aquilo é na turma do Duzentos”.
Realmente, poucos minutos após, apareceu a jovem, formosa e simpática colega, toda afogueada e vermelha, tanto da surpresa como da estranheza do que lhe havia acontecido. quando ela pôde relatar o sucedido, contou:
- Vocês nem imaginam o que me aconteceu! agora, quando eu estive a fazer as avaliações finais! O “Duzentos” desabrochou! O “Duzentos” revelou-se!
Quando ela detalhou os pormenores do que lhe havia sucedido, relatou que tudo tinha corrido normalmente enquanto ela fizera as avaliações a cada um dos alunos, afora o facto de o “Duzentos”, o sempre calado e quase imóvel e não participativo Duzentos ter-lhe dito, quase em tom de confidência, que no fim da aula queria dizer-lhe uma coisa.
Pensando que o jovem quisesse revelar algo da sua vida que o perturbasse ou preocupasse, a jovem professora ficou curiosa.
Quando, por fim, ela ia dar a aula por terminada, o Duzentos, com toda a coragem que pudera encontrar no seu espírito de absoluta timidez, ergueu-se e com toda a convicção, cantou-lhe uma música de um grupo romântico brasileiro que nessa época fazia grande sucesso: os “Roupa Nova” e que começava assim:
“Linda, só você me fascina…”
Daí a grande salva de palmas que ouvíramos na sala de professores.
E, desta forma, terá sido a última vez que o tímido e apagado “Duzentos” terá visto a sua bela, jovem e simpática professora de Físico-Química.

(fotografia disponível em https://espacomemoriablog.wordpress.com/)

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