Reflexões Aleatórias | Lurdes Neto

Eu considero que, ao trocar as crianças de berço, a protagonista do conto queirosiano “A Aia” tomou uma atitude heroica e patriota. Sendo o patriotismo uma ideologia que valoriza a nação, através de um sacrifício maternal, a aia defendeu o pequeno príncipe indefeso e, consequentemente, garantiu a sucessão ao trono e a prosperidade da nação. Ao entregar o seu próprio filho à morte para salvar o herdeiro ao trono, a aia demonstrou uma enorme dedicação e lealdade para com os seus senhores e uma coragem incomensurável: “Só a ama leal parecia segura – como se os braços em que estreitava o seu príncipe fossem muralhas de uma cidade que nenhuma audácia pode transpor.” Além disso, a aia adquiriu uma densidade psicológica significativa, comprovando ser uma mulher de uma dedicação desmesurada ao filho, ao príncipe e ao reino. Ela prova, com o gesto da troca das crianças, uma grandeza de alma que não pode ser compreendida por nenhum humano e que, por sua vez, não tem nenhuma recompensa, pagamento e/ou compensação material. A crença espiritual que alimenta o seu gesto demonstra um carácter decidido e uma simplicidade de pensamento que coloca o dever acima de tudo, seja o dever de mãe seja o dever de escrava para com o rei e sua nação. Apesar de ter salvo uma vida, acaba por matar o próprio bebé, mas isso não altera o facto de que tal ato carrega consigo um imenso patriotismo. Todavia, ela recorre a tal sacrifício também devido às suas crenças, certa de “que a vida da Terra continua no Céu”. Logo, crê que após a sua morte encontrará de novo “o rei seu amo”, bem como o seu precioso filho sacrificado, que poderá amamentar “feliz na sua servidão”. Em suma, julgo ser evidente que a aia, personagem que dá título ao conto, revelou heroísmo, segurança, lealdade e, sobretudo, espírito patriota.

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