A Minha Voz Conta!|Fabiana Antunes


(formanda do processo de RVCC Secundário do Centro Qualifica da ESEACD)

Quem consegue viver sem 3.500 canais de TV? No ano do meu nascimento apenas dois canais existiam, a RTP1 e a RTP2, e as pessoas viviam, como é que tal era possível? Verdade, existia a rádio, esse fiel companheiro, que até tinha radionovelas, vejam bem, e as pessoas ouviam e seguiam atentamente o “Simplesmente Maria” que foi um êxito estrondoso, não do meu tempo, pois ainda não era nascida, portando, ainda do tempo do Jurássico. Ora com 12 anos de vida surge a SIC e a TVI, quatro canais para disfrutar, sem contar com a Telescola, esse não contava para nada… Mas foi uma revolução a SIC e a TVI, principalmente com o BIG SHOW SIC, que loucura “a televisão em movimento” diziam. E era, como é que aquilo era possível sem uma boa dose de “doping” à mistura, até de ver ficava cansada a ver o Baião a correr e a dançar com o Macaco. Mas eis que surge em Portugal em 1994 a TV Cabo, com uma solução inovadora de oferta de imensos canais de TV para nosso deleite. Por uma prestação mensal tínhamos acesso a conteúdos que não eram possíveis nos canais nacionais. Hoje em dia, têm canais para todos os gostos e feitios, desde canais dedicados inteiramente ao cinema, desporto, ele há para golf, futebol, basquetebol, tiro ao prato, pesca desportiva, culinária. Atenção que há vários canais de culinária, está na moda, há desde vegetarianos, vegans, sabores da terra, enfarta brutos, tudo o que quiserem e imaginarem. É só salivar… Um verdadeiro culto aos “Chefs”, com ou sem estrelas Michelin, até concursos desde pequeninos a graúdos que queiram ser verdadeiros “Chefs”. Mas não se pense que o percurso é fácil, não senhora, é duro para miúdos e graúdos, o ensinamento é célere e tens de ter a esperteza de uma raposa se não queres ser engolido pela concorrência.
Aceitar de bom agrado os insultos do “Chef” humildemente e no fim dizer “SIM CHEF”, alto e bom som. Faz parte da aprendizagem, assim parece, pelo que dá para observar. Outra vantagem neste tipo de aprendizagem são os adjetivos dedicados ao insulto que enriquece ao vocabulário dos aprendizes. Segundo parece é assim que funciona numa cozinha de grandes Chefs. E meus amigos a audiência que estes programas têm, conseguem concorrer com a Cristina Ferreira, o que já de si é uma tarefa Hercúlea!
Existem também concursos de quem canta melhor, para miúdos e graúdos. É vê-los aos berros a ver quem canta mais alto e melhor. Pela experiência de quem assiste, convém que associado ao concorrente exista uma estória de tragédia, parecendo que não, aumenta exponencialmente o desejo que o mais desgraçadinho venha a ser o campeão das cantorias. Nestes casos a desgraça associada ao concorrente tem de ter um misto de miséria, morte de entes queridos, e muita humildade. Convém igualmente que antes de subir ao palco a produção o entreviste com música muito triste como pano de fundo e que nos faça saltar uma lágrima no canto do olho, ou mesmo em casos mais bem trabalhados, que nos provoque o famoso “nó na garganta”, caso contrário, todo o trabalho foi em vão… Existem canais dedicados à vida animal, automóveis, moda, decoração, vida dos famosos, como é que eles vivem (aquilo é real), talk-shows, e até de cirurgias estéticas, que vão desde o “Lifting”, “abdominoplastia” “lipoaspiração” aumento mamário e diminuição também e ainda lobotomias, estas na minha opinião, as mais interessantes de se assistir! Interessantes também são programas dedicados aos desesperados por amor, e ele há de diversas formas e feitios, onde o denominador comum é aceitar a troco de dinheiro ou prémios, fazerem completos papéis de idiotas, onde são insultados, choram, mas não desistem, tudo por amor. O que faltar nestes pacotes podem encontrar no mercado operadoras de séries e filmes em “Streaming”, ou seja, pouco falta para nos entreter. Pois bem, feito o contrato com a operadora, aguardam-nos dois anos de amarras ao operador escolhido. Sim, porque estamos num mercado livre e não podemos rescindir quando nos apetece. Normalmente são dois anos de pura felicidade, onde nunca se enganam nos valores das faturas e onde não cometem erros. A acontecer, e aconteceu comigo, paga-se e a seguir reclama-se, tal qual se faz com o Estado Português com as Finanças. Há e tal, há um erro, sim senhora, parece que sim, mas a senhora só pode reclamar depois de pagar, faz um requerimento no formulário B359994 e remete ao Chefe das Finanças que depois dará o seu parecer. Dará ou não, muitas vezes, não... Assim é com as Operadoras de canais de TV. Acontece um erro, liga-se para a operadora e simpaticamente se ouve uma gravação (mas com uma voz muito humana) a pedir-lhe para selecionar a opção pretendida. Passada esta dificuldade, ouve-se a ligação à opção escolhida e eis que surge a voz da Mariza numa bonita canção em “looping”, alusiva ou patrocinada pela operadora, durante uns bons 20 minutos. Este procedimento tem a vantagem de além da reclamação que iria fazer, lhe acrescer ao seu conhecimento a letra completa da música que acabou de ouvir nos últimos 20 minutos de espera. Finalmente, um(a) operador(a) atende a chamada, uma pessoa de verdade, nesse momento o sentimento que nos invade é o mesmo que ouvir os sinos na Igreja a anunciar a chegada da Noiva e a música celestial. Mas, não, afinal havia outra, parece que vamos ter de aguardar mais um pouco para poder consultar o processo. Parece que afinal os elementos que o atendimento automático nos solicitou não cumpriram os seus desígnios. E eis que surge novamente… a Mariza pois claro, não, não é uma canção diferente, é exatamente a mesma, mais 20 ou 25 minutos da mesma canção para termos a certeza que ficámos a saber a letra na ponta da língua. Mas finalmente voltamos ao contacto e o funcionário simpaticamente pede-nos desculpa pelo tempo em que estivemos a aguardar, mas infelizmente não nos consegue ajudar, terei mesmo que me deslocar a um espaço físico do operador. Resta-nos dirigirmo-nos ao local mais próximo que o operador tiver na nossa zona geográfica. Chegados ao local, tiramos a senha e ficamos a saber que temos 30 pessoas à nossa frente, o que significa uma espera superior a um atendimento de uma urgência num hospital público. Desesperante? Não, apenas ficamos sem simpatia nenhuma para quem nos atende quando chegada a nossa vez. Pelos vistos, o facto de termos sido privados de televisão durante quase um mês não nos dá o direito de rescindirmos o contrato por justa causa nem de sermos ressarcidos, isto apesar de termos pago o mês em questão como se o tivéssemos usufruído. Posto isto, não me restava outra opção que não a reclamação por escrito, quer no formulário próprio da operadora assim como no livro de reclamações à Ordem da ANACOM. Mais tarde, afinal, parece que nos deram razão, pois creditaram-nos o valor pago da prestação com um formal pedido de desculpas. Mas não houve um pedido de desculpa pelo facto de ouvir a mesma música da Mariza durante mais de 45 minutos, e eu também tinha reclamado isso por escrito. Estas operadoras ignoram-nos durante quase cerca de dois anos da duração do contrato, curiosamente quando está para terminar o contrato, recebemos inúmeras chamadas telefónicas de um número desconhecido com alguém extremamente simpático do outro extremo da linha a oferecer-nos mais canais, mais internet, um bolo no nosso aniversário, balões alusivos à festa e ainda por menos dinheiro, digam lá se dá vontade de mudar de operador, claro que não!

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