Eu vim de longe|Sofia Puglielli

Nesta nova edição do P&V a rubrica Eu vim de longe teve por convidada à Adele Fadul, que frequenta o 12º ano de Línguas e Humanidades, com 16 anos, neste ano letivo 2019/20 e veio da Guiné há sete anos. Adele nasceu em Portugal devido a motivos de trabalho dos pais e voltou para Guiné ainda bebé. No entanto, por motivos familiares, a sua vida deu uma volta inesperada e, com nove anos, regressou a Portugal. Comenta que a carga escolar foi das diferenças que mais lhe causaram impressão “os horários eram diferentes, só tínhamos aulas de manhã ou à tarde”. Alem disso, Adele afirma que a escola na Guiné não era muito desenvolvida em termos de matéria e que por consequência a dificuldade era diferente, “Quando cheguei cá os livros eram enormes, desci as minhas notas até o ponto de ter a minha primeira negativa, coisa que me marcou muito”. Depois de demorar uns três anos para melhorar e habituar-se, tendo quase desistido, Adele conseguiu recuperar. Com a notícia de regressar a Portugal vieram, sem dúvida, muitas mudanças, “Estava muito feliz pois sabia que tinha nascido cá, mas nunca tive a oportunidade de realmente conhecer Portugal” confessa. “Ainda tendo saudades da sua família e amigos que se encontram na Guiné”, Adele assegura que vir para Portugal lhe abriu muitas portas que “se calhar lá não iam abrir”. Nas palavras desta jovem de 16 anos, “Os professores fazem tudo por ajudar aos alunos”, realça este fator como uma das coisas que mais gosta de Portugal, para além do clima, a comida e as novas amizades. No entanto, Adele também denuncia os aspetos que menos gosta de Portugal e que, ainda depois de sete anos de morar cá, ainda lhe fazem impressão, entre eles o desrespeito pelos mais velhos: “na Guiné são os professores e nós os aprendizes, respeitamo-los porque eles fazem tudo por nos, instruem-nos”, e o preconceito baseado na aparência “além disso, todos éramos muito amigos, quer nos conhecêssemos quer não, não havia preconceitos“. O racismo e a discriminação não se ausentaram nesta experiência tão marcante, “No quinto ano, especialmente, aconteceram-me situações de intolerância para com os negros com comentários muito maus que só diminuíram no sétimo ano”. Adele afirma que as pessoas mais novas são aquelas com maior dificuldade para aceitar, “acabei por perdoar pois, ás tantas não era culpa delas, tem a ver com a sua educação, com o exemplo que têm dos mais velhos”, no entanto também confessa como “os preconceitos marcam a pessoa, levando a questionar-me se o mal está em ser negra.”
Com já algum tempo já em Portugal, Adele admite um certo nível de aculturação, “o meu pai sempre teve o hábito de não nos deixar falar crioulo em casa, menos agora em Portugal devido a semelhança com algumas palavras do português, por medo a misturá-lo com o português” (o Crioulo serve como uma língua em comum entre as diferentes etnias da Guiné). Em casa ainda que não se encontram muitos dos produtos para confecionar os pratos do lugar onde cresceu, mas ainda se mantêm traços da gastronomia. “Já adotamos muito a cultura portuguesa” concluiu.

Fotos por Inês Cruz.

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